quarta-feira, 9 de abril de 2008

Sonhos acordados

Eu vou contar mais uma coisa sobre mim. Sou absurdamente distraído. Perco todos os meus guarda-chuvas. Esqueço nomes de pessoas, caminhos para os lugares. Perco-me nas direções. Tenho dificuldades para saber qual é a minha direita e qual é a minha esquerda.

E o motivo de tudo isso, eu já sei. Eu fico o tempo inteiro pensando. Qualquer coisa, besteiras mil. Mas na maioria das vezes são histórias. Já escrevi em minha mente umas mil versões da história sobre o que eu faria se ganhasse na loteria. Fico inventando filmes em minha mente. Vídeo-clipes. Invento músicas, imagino que estou tocando determinada música, uma hora eu canto, em outra toco bateria e ainda tenho tempo de sair correndo e pegar na guitarra para fazer o solo.

Faço planos enormes, para os próximos 30 anos. Já me imaginei prefeito, governador, presidente, embaixador, presidente geral da ONU... Já imaginei como seria meu programa de televisão. Já idealizei um canal de televisão, uma gravadora na qual só entrariam as bandas que eu gostasse. Imaginei que eu tinha um harém. Imaginei cada uma das 20 mulheres que eu teria. Imaginei detalhes arquitetônicos da minha mansão. Já inventei um bar, um clube, uma escola. Uma reforma educacional para o país. Outra política. E todas faziam um enorme sentido, apesar de saber que nunca dariam certo.

E de tanto imaginar essas mil coisas, na maior parte do tempo eu não estou presente na realidade. Mas isso sempre foi assim, e isso nunca foi um problema tão grande... É claro que já sofri um acidente por que estava desligado enquanto dirigia e já me atrasei por errar os caminhos centenas de vezes... Mas nada disso chega perto das coisas que tem acontecido ultimamente, desde que comecei a ler aquele maldito livro. E o pior é que as coisas pioraram ainda mais desde que comecei a escrever neste maldito blog.

E o pior é que eu não consigo parar. E a minha própria imaginação está ficando cada vez mais real. Tão real, que às vezes eu prefiro não sair de lá, e ficar imerso em meu mundo, que eu construí para mim mesmo, com todos os meus sonhos. Com todas as coisas no lugar, pessoas fazendo exatamente o que eu quero.

Mas aí eu acordo e percebo que tudo é diferente. Eis o presente mais irônico já dado pelos deuses. Tua consciência. Com ela és capaz de brincar de ser Deus. Pode criar um universo inteiro, do jeito como bem entender. Mas jamais poderá esperar que as coisas do mundo concreto obedeçam a seus anseios, por que, na maioria das vezes não obedecem. Às vezes o que elas fazem é contrariar totalmente. Parece até que é de propósito.

E é quando você fica puto com o autor invisível que escreve a história da tua vida. Por que você não queria que fosse assim. Você consegue sempre imaginar um final melhor para a história que ele está inventando, pelo menos quando é você mesmo o personagem. Mas aí você se pergunta... Se os personagens escrevessem a própria história, teria alguma graça?

5 comentários:

Anônimo disse...

Viver no mundo que criamos para nós mesmos é sempre melhor, o ruim é quando percebemos que é tudo uma ilusão... Mas quem é que garante que o mundo "real" também não é uma outra enorme ilusão?

Anônimo disse...

Mas nós escrevemos nossa própria história....

bud disse...

Aê, belo texto.

Vou dar minha opinião sobre a relação entre os mundos que você colcou à tona.

Me diga, como podes provar que este mundo que você está nele agora, é real?

Eu falo (mas não creio) que, a mente, que é você, a minha mente, sou eu, é um todo criador que vive no subconsiente, o nosso mundo real, indivídualista, cada um com o seu.
Você mesmo disse, quantas coisas que criou, e que poderia ser Deus... por que não ser? Você cria algum ser e dá vida à ele no seu subconsiente, seu mundo real, onde sua mente (você) está. Já reparou que quando você pensa em algo já pensa em outra coisa logo após? Que sua imaginação é desordenada? Já pensou, se não houvesse esse mundo aqui em que estamos, com essas "idéias" fixas, para nos ajuar em imaginar, criar algo pareceido com esses "seres" que hão aqui, como seria seu subconciente? Já pensou, que caos seria? Você criaria algo sem a menor noção do que seria, penso eu, e, como sua mente é um todo criador, e raciocinador, ela pensou e criou esse nosso "mundo das idéias" (é, assim mesmo como Platão). Digo que, a nossa mente tenha "dois pólos", um negativo e outro positivo, o negativo, é o que estabelece uma ligação com o seu mudo e o que pensa, raciocína mais criticamente, e os nossos positivos, em conjunto, são os que criam e fixam esse mundo aqui por algum tempo indeterminado para nós se acostumarmos com algumas idéias a serem pensadas ou criadas em seu mundo real, para não viver de "não sei o que", como disse antes. Logo, eu sou Deus do meu mundo! Eu crio seres parecidos com essas idéias!
Quem estiver lendo, somos Deuses!
Essa é uma prévia de um livro que estou escrevendo, que tive de postar aqui.

SHAKAL disse...

Estou lendo seus posts tem 2 dias contando com hoje, não na ordem como seria o correto, e se tratando de seus posts de 2008, este é o seu mais significante, onde você diz que já escrevia a mais tempo neste blog, mas para mim aparece este como seu primeiro post. Engraçado esta postagem ter relação com uma mais posterior da Cidade dos Sonhos. Tratando-se de sonhos, querendo ou não, cientistas desconhecidos para mim, mas famosos no mundo científico afirmam que o estado da pessoa querer dormir até mais tarde e continuar sonhando, se em doses desprecavidas e constantes, pode representar perigo a sanidade mental da pessoa, pois se trata da fuga da realidade, porque ela já está num estágio em que SEM PERCEBER acha melhor continuar sonhando do que acordar, sem perceber porque pra pessoa, aparentemente isso não é nocivo. Os cientistas dizem que isso é sinal de que a pessoa confunde o que é real do que não é real, tende a achar que uma determinada ação sua ou interpretações suas são ditas "normais", ou seja, não percebe que as loucuras que sonha ou que deseja não acontecem, é como aquele que usa a droga como fuga da realidade, dos seus problemas pessoais. Então, a pessoa que gosta de sonhar em demasia vive num mundo que não obedece ao seu padrão de comportamento. O que o torna louco, em termos mais fortes o preconceituoso diria "depravado, insano, doente" etc. O que discuto aqui não é a sanidade ou que o que é normal ou padrão seja correto, até creio que um louco às vezes seja menos animal ou irracional ou doido do que uma pessoa dita "normal". Foucault, Thomas Stephen Szasz entre outros que estudaram me ajudem nesta hora, mas há loucos que são mais normais do que muita gente considerada normal. O louco não mata por poder, um psicopata (não todos é claro) não mata sem um motivo que para ele é lógico e cabível. Não entrando no mérito da questão, os cristãos mataram pessoas por motivos absurdos, seguindo seus conceitos éticos e morais, que eles mesmos criaram, seja por crença ou por poder, domínio sobre os outros.

SHAKAL disse...

Como eu disse antes, esse seu texto entre os de 2008 para mim é o mais significativo, diferentemente do que Paule disse ao falar: [...] "Eu falo (mas não creio) que, a mente, que é você, a minha mente, sou eu, é um todo criador que vive no subconsiente, o nosso mundo real, indivídualista, cada um com o seu.
Você mesmo disse, quantas coisas que criou, e que poderia ser Deus... por que não ser? Você cria algum ser e dá vida à ele no seu subconsiente, seu mundo real, onde sua mente (você) está. [...]. Creio você em nenhum momento ter falado sobre Deus - posso estar enganado -, mas sim tenho quase certeza que você escreveu relacionando seu desejo de que as pessoas agissem de tal maneira, mas quando você observa como sua vida caminha, não obtendo o final esperado, fica puto com com os rumos que sua vida toma, seja por destino, acaso ou vontade própria. O que torna o fim de seu texto mais bem esculpido, ao por culpa à quem escreveu sua história. Ao mesmo tempo concluindo com o fim brilhante de que é melhor deixar as pessoas tomarem suas próprias decisões, por mais arbitrárias e por mais que você discorde delas, simplesmente aceitando como elas são e não tentando mudá-las, pois elas serão assim mesmo. A maestria que está embutida em seu texto se encontra ao se perguntar: "Se controlássemos como as pessoas agiram conosco e com os outros, o mundo teria alguma graça?". Pois os personagens no fundo são autores de sua própria história. A relação entre uma sentença e outra em seu texto está em primeiro querer manipular seus acontecimentos a sua volta, depois se queixar de como sua vida está sendo "manipulada", negando a primeira sentença e por último deixando de dar palavra ao personagem para dar palavra ao autor. Mas neste mundo de sonhos em que cada um é sonhado, e em sua metáfora o autor também é um personagem por também ser sonhado, o personagem não deixa de ser um autor, pois o autor quando era autor sonhava como os seus personagens agiriam, inclusive você mesmo:

"E a minha própria imaginação está ficando cada vez mais real. Tão real, que às vezes eu prefiro não sair de lá, e ficar imerso em meu mundo, que eu construí para mim mesmo, com todos os meus sonhos. Com todas as coisas no lugar, pessoas fazendo exatamente o que eu quero."

Posso estar errado, mas tenho bases fortes (certezas e indícios - paradoxal escrever certeza para logo em seguida indícios, mas não contraditório) para dizer que a minha interpretação do que você quis dizer com o seu texto seja realmente o que você pensou ao transcrever estas palavras, pois você em outra postagem diz ser “Antes que digam qualquer coisa, eu não sou 'cristão' no sentido mais usual da palavra. Minhas crenças são meio ecléticas e porque não, excêntricas e disfuncionais. Eu sou meio adepto do animismo dos povos primitivos".

Caso esteja errado, dê um sinal de vida. Iria acrescentar no meio do texto uma frase de um filósofo sobre o que ele fala sobre utopia, mas não sei em qual dos livros dele e em qual parte está.